Quem foi gamer durante a década de 90, sabe que era praticamente impossível se achar um jogo em português, e assim se tornou bem comum, para crianças da época, jogar coisas até mesmo em japonês. O tempo passou e jogos em português se popularizaram, fazendo assim ter uma exigência do público em adaptações para português brasileiro. Mas algo em português é mesmo necessário? Ou pura frescura e preguiça de aprender um novo idioma? Vamos falar um pouco sobre a questão nessa matéria!
O anúncio do remake de Silent Hill 2 deixou muita gente extremamente empolgada, afinal de contas um dos mais amados jogos do gênero iria ser reapresentado. No entanto, assim que abriu a página da Steam, a Konami causou a ira de muitas pessoas, visto que dos 13 idiomas disponíveis, incluindo duas versões de espanhol e duas versões de chinês, o português presente era apenas português de Portugal.
O
fato de ter sido um anúncio de 2022, em que há anos as traduções PT-BR eram padrões na indústria, pegou de surpresa muita gente ao
ver a ausência de português brasileiro, visto que a Konami é uma empresa
gigante e com recursos para fazer uma legenda. Muitas pessoas se
manifestaram negativamente em relação à coisa, no entanto também
apareceram pessoas para defender a empresa.
O
principal argumento foi sobre ser muita frescura as pessoas exigirem
algo assim, já que antigamente não tinha legenda nenhuma e as pessoas
jogavam mesmo assim. Também foram levantadas as afirmações de que os que
se incomodam são preguiçosos e que deveria ser obrigatório todo mundo
saber inglês.
O negócio é que os anos 90, até existiam jogos em português, mas no geral eram de computador, como Prisoner of Ice, e mesmo assim não era todos. Um dos jogos mais clássicos daquele tempo, que é Disney's Magical Quest 3, marcou a infância de tanta gente e foi jogado por todo mundo em japonês, já que simplesmente ele não foi lançado em inglês até o relançamento pra Game Boy Advance, anos depois.
E então veio a era das traduções pelos próprios fãs. Fantásticos trabalhos eram feitos em roms de jogos, usando códigos hexadecimais para alterar palavras em trabalhos louváveis. Logicamente no PC a coisa era muito mais simples, e foi onde as traduções realmente dominaram, aparecendo até mesmo grupos concorrentes.
Alguns poucos jogos saiam em português aqui e ali. Muitos deles até tinham para console, como Max Payne e Soul Reaver, mas feitos localmente pelas distribuidoras, ou seja... A versão de console simplesmente ficava em inglês mesmo. E é lógico que isso fez sim com que muita gente acabasse melhorando no idioma e os mais esforçados passaram a dizer que aprenderam inglês jogando videogame.
Mas lá por 2010, rolou um estouro, e enquanto alguns jogos mais revolucionários nesse quesito vinham com legendas em português de fábrica, e eu inclusive fiz uma lista dos jogos que vinham em português antes mesmo da mania pegar, muito provavelmente o divisor de água foi Starcraft 2, que a Blizzard lançou por apenas R$49,90 no Brasil e com uma das localizações mais cabulosas até hoje, pois as partes em CGI tinham elementos visuais escritos em português e rolou sincronia labial, ou seja, um investimento monstro!
Naquela época, mesmo gigantes não investiam no Brasil, dublagem em português era de Portugal apenas. Então God of War 3 da Sony foi lançados naquele mesmo ano e o investimento dela era no português europeu. Já a Ubisoft, que hoje é tão conhecida por todos os seus jogos serem dublados, só começou em 2012, com Assassin's Creed III.
O fato é, rolou um estouro e passou a ser padrão se ter dublagem em português, sendo que ao longo dos anos, gigantes foram aos pouquinhos começando a investir no nosso país. Algumas franquias demoraram mais, como Resident Evil Village, que só em 2021 iniciou a tradição de ser em nosso idioma, até algumas empresas indie que se mostraram ousadas no quesito, como Orcs Must Die em 2011, já dublado em português, mesmo sendo de empresa pequena.
E por falar em jogos indie, se tornou completamente padrão as legendas aparecerem em português. Então passou a não ser surpresa alguma quando alguém baixa algum joguinho pixelizado e já estar em nosso idioma, e isso antigamente com certeza seria surreal, afinal de contas se empresas grandes, que tinham dinheiro, não investiam, imagina um jogo pequeno, muitas vezes feitos por apenas uma pessoa que não tem dinheiro pra nada?
A verdade, é que, enquanto muitas pessoas pensam que traduções para português são apenas pena de brasileiro ou uma bondade que empresas estão fazendo, já que somos irrelevantes e pobres, não se destacando internacionalmente, a coisa com certeza não é bem assim. E grandes empresas não têm pena de ninguém, elas são máquinas de fazer dinheiro e suas ações são estratégicas. Sendo assim, se de repente estourou a coisa e não parou mais, é porque uma nova fonte de dinheiro foi detectada por elas.
Se tornou comum ver pessoas surtando com empresa em relação à ausência de traduções para português. Mas também sempre aparecem pessoas defendendo e dizendo que esse tipo de atitude só vai espantar as empresas e elas não vão mais querer fazer a bondade de nos dar traduções, já que o público deu chilique pela ausência de uma. Mas realmente é um pouco difícil associar isso a bondade ou pena...
Uma das coisas que mais deixa isso evidente, é o fato de que antigamente tínhamos tantas traduções para português europeu e de repente passou a se tornar padrão o português brasileiro. Se fosse realmente pena, por que passaram a investir menos em Portugal? Quem jogou os jogos do Harry Potter, lembra da dublagem em português de Portugal até no PS1.
Um bom exemplo é Heavy Rain, que foi lançado com dublagem em português de Portugal em 2010. Mas ao olhar o Resident Evil 4 original, só tinha inglês, espanhol, francês, alemão e italiano, mas o remake já foi anunciado com dublagem em português brasileiro, enquanto o português europeu nem ao menos legendas recebeu. Então realmente tem como associar a pena?
O que acontece é que o Brasil tem mais de 212 milhões de pessoas. Em 2022 a Pesquisa Game Brasil (PGB) revelou que um 3 em cada 4 brasileiros (153 milhões de pessoas) consomem jogos eletrônicos. Claro que não dá pra contar isso tudo como se fossem gamers hardcore, então vamos diminuir esse número para dez vezes menos, 15,3 milhões de pessoas, ainda assim dá mais do que a população de Portugal INTEIRA, que é pouco mais de 10 milhões de pessoas.
E como vocês já devem imaginar, a população inteira de Portugal não é gamer, mas mesmo que fosse, não conseguiria superar a quantidade de pessoas no Brasil. Somos o quarto maior país do mundo, o sétimo país mais habitado e a nona língua mais falada do planeta. E esse é o verdadeiro motivo do investimento no Brasil, um mercado imenso.
Por isso que temos jogos indie com traduções para português, porque criadores de jogos também estudam o mercado e procuram se informar sobre o que seria interessante investir. E as línguas mais faladas e maiores públicos são coisas que valem a pena. Muitos veem isso como um investimento em tradução que vale a pena, enquanto outros preferem usar um Google Tradutor, que às vezes fica perfeito e às vezes fica só a bagaceira, mas só o fato da pessoa procurar por uma tradução, mostra que ela sabia que seria interessante fazer isso.
Em relação à dublagem, isso inclusive gerou debates fervorosos em relação a jogos nacionais. Isso porque alguns são dublados apenas em inglês, como Distortions e Blade and Bones, que contam apenas com legendas. Mas a mesma lógica de alcance é usada, só que de forma reversa, afinal de contas dublagem de qualidade são caras. Qualquer um pode dublar em português, mas nem todo mundo consegue fazer algo decente. Então se vai investir pesado em algo, para um indie é mais interessante algo que possa ser compreendido por um francês, um coreano e um alemão.
Por outro lado, a legenda se tornou algo realmente essencial! E assim quando jogos brasileiros como Momodora III e Big Earth não apresentam legenda, é normal ver fãs surtando. E um equivalente são empresas grandes não disponibilizando legendas em português. Isso aconteceu com a Konami quando liberou a página de Silent Hill 2 Remake e estava listado apenas português de Portugal.
E graças a isso rolou a revolta de parte da comunidade. Mas também rolou dois outros grupos, sendo o primeiro que protegeu a Konami, falando que as pessoas ficaram frescas demais e que todos tinham mesmo que aprender inglês e não a empresa se esforçar para ter que ficar gastando dinheiro pra ajudar jogador. E o segundo grupo foi o que disse que tanto faz, já que na legenda é bem parecido, diferente da dublagem.
Por outro lado, defensores das legendas apontaram os valores surreais de jogos e como é preciso se exigir e não simplesmente abaixar a cabeça e deixar fazerem o que quiserem. Um exemplo foi Babylon's Fall, que cobrou 500 reais na edição mais cara, mas ainda assim tinha que pagar por itens dentro do jogo, seis meses depois anunciaram o fechamento dos servidores e a Gamestop foi pega tacando cópias no lixo por não vender.
E claro, isso acabou gerando uma longa discussão envolvendo vários pontos, alguns dizendo que a tradução iria sair por fãs, então não precisava se preocupar, outros falando que isso incentiva a pirataria, tendo também os que dizem que é frescura e que dá pra pegar legalmente, apenas é necessário esperar um tempo pela promoção, e assim vai...
A verdade é que no fim das contas acaba se mostrando algo que depende muito do ponto de vista de algumas pessoas. Tem aqueles que sabem inglês e realmente não faz diferença a coisa, até porque existem jogadores que mesmo com dublagem, jogam até com legendas em inglês. Por outro lado tem os que veem mais em relação ao que é oferecido comparado ao que é pago e como é o tipo de elemento que é básico demais para não se exigir.
E vocês? O que acham de jogos que não vem com tradução em português atualmente? Isso incomoda? Ou tanto faz? Acham que tem o mesmo peso para empresas indie e desenvolvedoras grandes? E em relação aos jogos nacionais? Dispensam a dublagem? Ou acreditam que também é algo necessário? Comentem aí!
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