Quando se ouve falar em destaques do cinema japonês, um nome rapidamente é falado, Akira Kurosawa. O diretor se tornou um destaque não apenas local, mas mundial, apresentando técnicas únicas e visuais maravilhosos acompanhados de histórias divertidas que obviamente fizeram o público acabar amando. Mas todo mundo tem um começo, e hoje vou falar sobre o primeiro filme dirigido pelo mestre do cinema oriental.
A história se passa no ano de 1882, no Japão, quando um jovem chamado Sugata Sanshiro se muda para uma cidade para aprender a lutar Jiu-jítsu. E assim começa a aprender com o mestre Monma Saburo. No entanto, uma nova arte marcial começa a se popularizar, o judô, que é considerado uma fraude pelos mais tradicionais. E assim os alunos de Saburo se juntam para assassinar o mestre de judô Yano Shogoro, mas se surpreendem quando ele derrota todos e assim Sugata Sanshiro decide virar seu discípulo.
Esse filme foi feito durante a Segunda Guerra Mundial, uma das épocas mais turbulentas da história da humanidade, e também muito complicada para se publicar qualquer tipo de conteúdo de entretenimento. E embora Kurosawa já tivesse trabalhado por cinco anos com produção de cinema e assim aprendido muito, essa foi a primeira vez que ele assumiu oficialmente a posição de diretor.
A verdade é muito provavelmente esse não seria o primeiro filme do cineasta se não fosse por causa da guerra. Ele tinha dois scripts impressos e inclusive um deles chegou a ser premiado pelo ministro da educação da época. No entanto as suas ideias não eram consideradas adequadas e ele se sentia preso em sua liberdade artística.
Foi então que ele viu a publicidade relacionada a um livro chamado Sugata Sanshiro, de Tsuneo Tomita. Ele tratava de um tema atual e local na época, que era a rivalidade entre o judô e o jiu-jitsu. O judô surgiu exatamente no ano de 1882, unindo as principais técnicas de várias escolas de jiu-jitsu. Mas como era algo novo, foi reprovado por muita gente e tinha uma certa polêmica. O livro era inspirado na história do lutador real Shiro Saigo.
Isso tornou a coisa perfeita, e Kurosawa rapidamente comprou uma edição ao lançarem e entrou em contato com o estúdio Tōhō, pedindo que eles reservassem a compra dos direitos autorais. Foi atendido e logo se viu que esse filme estava destinado a existir, sendo nas mãos de Kurosawa ou não. Isso porque dias depois outros três estúdios grandes apareceram pra disputar a compra dos direitos, mas a Tōhō saiu por cima.
Bom, antes de tudo já adianto que o filme não é uma obra prima. E mesmo tomando todo o cuidado pra não apresentar uma de suas ideias originais, o diretor ainda teve dificuldades em lançar seu filme, só saindo por intervenção do diretor Yasujiro Ozu, que conseguiu fazer ir aos cinemas e conseguiu fazer muito sucesso. No entanto o departamento de censura voltou atrás com o lançamento integral e pegou o filme pra retirar 18 minutos que se perderam no tempo, ficando disponível apenas a versão censurada.
É notável que se trata de um filme muito mais simples do que vimos depois. Quando assistia com um amigo, cheguei a comentar no quanto parecia um anime, devido à força exagerada do personagem, lançando inimigos a distâncias enormes e inclusive quebrando coisas. Depois que assisti acabei pensando e no geral é bem semelhante a um shonen, com o aluno delinquente juvenil que se lasca, mas vai ficando mais sábio e tem uma força que surpreende a todos.
Talvez seja algo que faça parte da essência da cultura japonesa, já que embora a primeira animação feita no Japão já tivesse sido feita há algum tempo, Katsudō Shashin lançado começo do século, os animes como conhecemos ainda não existiam. Sendo assim, passa meio que a sensação de live action adaptando alguma obra. Mas apesar do exagero em relação à força, é um filme sério, não sendo coisas impossíveis.
Em relação a técnicas, você não vê algo cabuloso como ele passou a desenvolver e que vemos em alguns outros filmes clássicos japoneses de outros diretores, como o maravilhoso Contos da Lua Vaga, que tem aquele visual surreal. Ainda assim, dá pra ver que existe um esforço para apresentar algumas coisinhas que se destacam visualmente.
Um exemplo é uma cena do céu passando em alta velocidade, o efeito do anoitecer, e algumas tentativas de mostrar beleza que acho que não são nada demais hoje em dia, mas que imagino que pra época era algo lindo, como um momento em que o protagonista admira uma flor e ela é comparada com uma nuvem em um momento do filme.
Então você percebe que existe um esforço. Mas sinceramente, o que eu acho que mais se destaca é o fato de que Kurosawa apresenta uma história decente e fluída, sem ser aquela coisa parada e cansativa, mas algo que tá rolando sem parar. Claro, a pessoa tem que assistir com algum interesse pra não achar cansativo, mas apesar da simplicidade da história, o resultado final foi algo que tem seu charme.
Enfim, Sugata Sanshiro foi lançado no Brasil como "A saga do judô" e foi uma curiosidade bacana de se ver. Eu não o recomendo pra todo mundo, mas se você é fã de cinema ou cultura oriental, tá aí um que é obrigatório estar na lista. Assistindo com um mínimo curiosidade, dá pra se divertir um bocado. Mas agora no geral é um filme simples que só conta uma história básica mesmo, sem grandes técnicas do Kurosawa ainda sendo aplicadas, apenas algumas mais discretas.
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