Existem inúmeras obras que mostram origens de personagens dos quadrinhos. A maioria com um aspecto mais sombrio, e Coringa também teve as suas adaptações para HQ. No entanto o foco em adaptações cinematográficas obviamente ficou para os heróis, mas com a popularidade do palhação inimigo do Batman, a Warner Bros decidiu tomar a decisão ousadas de um filme de início para o vilão.
Essa é a história de Arthur Fleck, um homem que sofre de um distúrbio mental não identificado que o faz rir frequentemente em momentos não apropriados, porém não por estar achando graça, mas por não conseguir se controlar. Somando isso à forte depressão e seu trabalho como palhaço, a sua vida é um contraste constante.
A doença que colocaram no filme é baseada na epilepsia gelástica, que é uma doença em que a pessoa sorri até ter convulsões. Achei bacana demais terem adicionado esse detalhe e acho que dá uma bela de uma profundidade ao personagem, especialmente porque vendo de forma bruta, o Coringa é apenas um palhaço louco, coisa que acaba sendo ainda mais escrachada se a pessoa vê obras como Batman Ninja.
Naturalmente é um personagem que também já tinha recebido um tratamento especial nos quadrinhos. Desde o que Alan Moore fez com Miracleman, o mundo das HQ's mudou e tivemos várias obras com heróis mais sérios como o Batman de Frank Miller e heróis que já nasceram com toque mais adulto como Spawn. No caso de Coringa tivemos o inesquecível A Piada Mortal.
Apesar disso, esse filme não adapta nenhuma obra específica, mas pega diversas características de várias obras. É lotado de easter eggs e é fácil colocar a história em uma realidade alternativa, pois é aquela coisa mais pura, sem gás do riso, sem tecnologias exageradas. Funcionaria perfeitamente em obras como Batman Ano Um, porém já ficaria super deslocado se você colocasse na série Gotham.
É adaptado nos anos 70 e mostra uma Gotham inspirada em Nova Iorque, com muito caos urbano, luta de classes, um ambiente todo ferrado. Isso inclusive faz com que esse universo se encaixe perfeitamente no universo de The Warriors, pois é fácil sentir a mesma atmosfera de ambiente esquecido e a classe rica isolada em um canto seguro e elegante. Outro ambiente que também acho que se encaixaria bem seria o filme de Watchmen, que apesar de ter uma tecnologia exagerada em certos aspectos, foca mais na parte "bruta" da coisa, com pessoas sendo pessoas, com seus acertos e erros, alegrias e dores.
A forma como conduzem o personagem é maravilhosa, enquanto o Joker de Heath Ledger tinha quele estilo mais pesadão, de ser alguém malvado e muito louco. O de Joaquin Phoenix consegue impressionar pela sutileza da coisa, conseguem fazer um palhaço normal não parecer apenas uma coisa boba, mas sim algo que é notável que está além.
A ideia da doença foi ótima demais, pois de repente o Coringa não é alguém que parece apenas estar se divertindo. Você não sabe o que está de gato acontecendo. Quando o personagem sorri, você simplesmente não tem ideia se ele gostou daquilo mesmo, ou se está apenas tendo uma crise. E a construção do personagem sobre o que ele sente acaba tirando toda a superficialidade de que só é um palhaço doido.
A coisa parece mais uma explicação do tipo "Veja como eu me sinto por dentro". Eu já tinha visto várias obras em que o Coringa aparece dizendo que quer colocar um sorriso no mundo, que as pessoas tem que entender melhor a "realidade". E esse filme faz com que isso pareça mais do que palavras de um malucão.
Para quem gosta de filmes psicológicos como Identidade, O Maníaco e Amnésia, certamente vai gostar bastante de forma que as coisas são conduzidas por aqui. Existem algumas pequenas surpresas dentro do filme, mas acho que o grande brilho mesmo acaba sendo a condução como um todo, pois por mais que não seja do tipo com uma baita reviravolta, a construção da história é bem incrível.
Com a quantidade de conteúdo escondido e referência a outros personagens e elementos do universo da DC e cultura pop da época reunido a certas cenas um tanto confusas, esse é daqueles filme que facilmente foram parar nos fóruns de discussão assim que foram lançados. E tem muita coisa que os fãs logo foram discutir sobre o que queriam dizer ou o verdadeiro significado.
Também há detalhes que não estão diretamente ligados ao universo DC em si ou àquele tempo, mas que são elementos feitos de forma propositais para serem referência à algo, como referências filmes anteriores de Robert De Niro (que participa desse filme), ou mesmo a coisas mais sinistras como a pintura facial do personagem ter inspiração na de John Wayne Gacy, o palhaço assassino serial killer.
A fotografia então é impecável! Por mais que não passe bem a sensação de Gotham, e sim de Nova Iorque mesmo, ficou muito legal. Os caras inclusive devem ter cagado dinheiro pra fazer esse filme, porque uma coisa que não falta é cena do lado de fora com uma tonelada de elementos da época como carros e tanto coadjuvante que você perde de vista. Então parece mesmo que você tá olhando nos anos 70.
Enfim, ótimo filme! Foi a primeira obra baseada em uma HQ da DC desde Watchmen que foi classificado como R (ou seja, focada no público adulto) e parece um segundo renascer do universo de heróis. Enquanto nos anos 80 vimos obras de crianças se tornarem obras para adultos, nesse filme vemos que heróis e vilões podem existir em um mundo sem exageros fantasiosos. Lembrando que na vida real já vimos pessoas insanas fazerem coisas dignas de super vilões, tipo o Graham Young.
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